Pedido de excomunhão

No dia 29 de outubro, logo após a repercussão de uma mensagem do Papa Bento XVI, para que seus bispos orientassem fiéis a não votar em candidatos favoráveis ao aborto, a ativista Maíra Kubík Mano redigiu e remeteu ao Vaticano um pedido de excomunhão, publicou o texto em seu blog e o distribuiu a algumas listas em que atua: pelo direito à comunicação, pelos direitos das mulheres, entre outras. “Escrevi essa carta ao Papa Bento XVI. Acabei de enviá-la por email ao Vaticano (benedictxvi@vatican.va) e também vou colocá-la no Correio. Fiz em português e inglês, para que não restem dúvidas sobre meu pedido.”, explicou Maíra.

Leia a seguir, a carta de Maíra.

À Sua Santidade Papa Bento XVI

00120 Via del Pellegrino

Citta del Vaticano

Pedido de excomunhão

São Paulo, 29/10/2010
Prezadas autoridades eclesiais,

Eu, Maíra Kubík Mano, cidadã brasileira, 28 anos, venho, por meio desta, solicitar à Igreja Católica Apostólica Romana minha excomunhão.

Fui batizada involuntariamente, quando tinha poucos meses de vida, pelos meus pais. Eles nada mais fizeram do que seguir a tradição de seus antepassados e não pretendo nem vou responsabilizá-los por isso.

Contudo, aos 9 anos, fui de livre e espontânea vontade tomar a comunhão (Eucaristia). Fiz o curso necessário para tanto na Igreja Nossa Senhora do Brasil, em São Paulo, SP, Brasil. Durante nove meses, aprendi os preceitos católicos e estudei passagens bíblicas. Em seguida, participei da cerimônia em que recebi, pela primeira vez, a hóstia, ou o corpo de Cristo.

Desde então, fui à missa poucas vezes e, com o passar do tempo, identifiquei-me cada vez menos com a doutrina católica. Ou, melhor dizendo, com aquela pregada diretamente pelo Vaticano.

É preciso aqui fazer uns parênteses para afirmar que tenho, isso sim, laços fortes com a chamada Teologia da Libertação, que inundou de solidariedade e compromissos sociais os rincões do Brasil na segunda metade do século XX. Mas com esse grupo, imagino, você não está preocupado. Conseguiu isolá-lo, desautorizá-lo, diminuí-lo. Porém, quero registrar aqui que não foi possível enterrá-lo. O exemplo de sua força segue vivo com D. Pedro Casaldáliga, Dom Tomás Balduíno e tantos outros.

De qualquer forma, cheguei à conclusão de que tenho um desacordo absoluto e completo com Sua Santidade, sem possibilidade de repactuação. Entre os pontos mais prementes sobre os quais temos visões diametralmente opostas estão legalização do aborto, casamento gay e utilização de preservativos durante o ato sexual. Isso só para começar a conversa. Poderia discorrer páginas e mais páginas sobre o lugar subalterno e humilhante que vocês têm reservado às mulheres durante séculos a fio.

A gota d’água que me levou a redigir essa carta foi a orientação de Vossa Senhoria para que os pastores orientassem politicamente seus fiéis com base em preceitos morais, tendo em vista a eleição para a Presidência da República que ocorre no próximo domingo (31/10/2010). Bem, para mim o único preceito válido é o do Estado laico e considero um absurdo completo a Igreja se pronunciar sobre isso. Religião e governo misturados é uma fórmula maléfica, que prejudica as liberdades individuais e coletivas.

E, como se tudo isso não fosse suficiente, atualmente eu me defino como atéia.

Sendo assim, peço que Sua Santidade seja sensível o suficiente para compreender que eu não quero mais ser considerada uma parte deste rebanho. Nem oficialmente, nem extra-oficialmente, e me conceda a excomunhão.

Obrigada desde já,

Maíra Kubík Mano

Ciranda Brasil publicou

Uma resposta para “Pedido de excomunhão”

  1. Penso que o tal pedido não se aplica neste caso, por motivos óbvios. Aliás, uma pergunta: quem dá a luz a um deus, o que seria?

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