Nem mesmo a falta de energia impediu que os/as jovens permanecessem na Tenda das Juventudes para assistir ao painel sobre Tráfico Humano. O debate, que contou com a presença de Paulo Abrão, do Ministério da Justiça, e de Irmã Henriqueta Cavalcante, da Comissão de Justiça e Paz, destacou questões como definição do tráfico de seres humanos, principais vítimas, ações de enfrentamento ao tráfico e políticas de proteção às vítimas e aos defensores de direitos humanos.
Irmã Henriqueta conversou com Adital sobre a importância de discutir o Tráfico de Pessoas com as juventudes e sobre a situação das políticas de enfrentamento ao tráfico. Leia a seguir:
Adital – O tráfico de seres humanos é um assunto bastante complexo e que ainda precisa ser debatido. Qual a importância de se discutir tal questão com jovens aqui nesse contexto da Tenda das Juventudes?
Irmã Henriqueta – É superimportante a Jornada ter priorizado esse tema de tráfico de pessoas, de tráfico humano, no espaço da Jornada, pelo fato de que a juventude é muito vulnerável a esse crime. A maioria hoje são jovens que são traficados, homens e mulheres, e pelo fato também de que esse crime é tão cruel, que ele não chega a ser reconhecido, ele não chega a ser identificado, ele acontece de uma forma silenciosa e, portanto, as pessoas ficam muito vulneráveis.
Trazer esse tema para a Jornada é aproximar muito mais os jovens para ficarem atentos. Primeiro: para se protegerem; segundo: para ajudar outras pessoas a se protegerem. A proteção se dá justamente através da informação e da formação. Quando as pessoas são informadas, elas ficam muito mais protegidas e menos vulneráveis. Portanto, eu considero muito boa a oportunidade de debater, de refletir esse tema e alertar para que a juventude possa, no próximo ano, que a Campanha [Campanha da Fraternidade de 2014 apresenta como tema: “Fraternidade e Tráfico Humano”] vem aí com esse tema, ela possa se envolver de forma muito mais comprometida e muito mais informada.
Adital – As principais vítimas são jovens e principalmente mulheres de baixa renda. Então, como fazer para trabalhar a prevenção, para chegar essa informação até elas?
Irmã Henriqueta – Hoje, a maioria das vítimas, quando a gente faz o levantamento, a própria pesquisa mostra isso, que a maioria é de baixa renda, de baixa escolaridade, mas hoje tem muitas pessoas de outras classes que também são envolvidas no tráfico. Não é traficada só quem é de baixa renda e quem tem pouca escolaridade. Hoje qualquer pessoa está sujeita.
Nós descobrimos em Belo Monte [Usina de Belo Monte que está sendo construída no Pará, estado da região Norte do Brasil] aquela casa que estava acolhendo moças que foram traficadas que eram de Santa Catarina, não tinha nenhuma paraense no meio, e tinha jovem lá que era inclusive filha de político, de vereador. Então, o tráfico hoje não está próximo só de quem é pobre. Ele não está próximo só de quem não tem escolaridade, está próximo também de outras pessoas, de outras classes que também conseguem se submeter.
Adital – E como está a ação do Governo Federal de enfrentamento ao tráfico?
Irmã Henriqueta – Então, o Governo [Federal] lança o 2ª Plano [II Plano de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas, lançado em fevereiro deste ano], a presidente já decretou o segundo Plano, mas ainda precisa caminhar muito, precisa fazer muita pressão para que os eixos de fato aconteçam.
Adital – Houve algum avanço do primeiro para o segundo Plano?
Irmã Henriqueta – Ele é recente, faz poucos meses que ele foi decretado e ainda não dá para fazer esse balanço se ele vai ser executado ou não. Eu só sei que nós, enquanto sociedade civil, temos que cobrar, principalmente no tangente à política de atendimento e de proteção à vítima, que está muito vulnerável. As vítimas ficam vulneráveis, nós, que denunciamos, ficamos vulneráveis, porque é uma rede perigosa, que envolve outros crimes, o tráfico de pessoas e tráfico de drogas.
Então, é muito complicado. E mais complicado se o Governo não vier dar conta da proteção e do atendimento qualificado a essas vítimas. Uma outra coisa que é um desafio que nós temos ainda no nosso país, é que nós sofremos uma deficiência de pesquisa qualificada. Nós não temos dados com precisão de quantas pessoas foram traficadas para fins de exploração sexual, quantos tráficos de órgãos, que é outra coisa que acontece que a gente não consegue perceber, quantas vítimas… No meu estado, por exemplo, nós temos notícias de que têm mães que estão vendendo crianças para estrangeiros por R$1.000,00 e que esses corpos não estão indo vivos. Então, quer dizer, nós temos essa lacuna.
Outra lacuna que nós temos é a qualificação das pessoas que prestam serviços a essas vítimas. Pessoas que não estão preparadas, não são qualificadas. A própria polícia não está preparada inclusive para fazer o papel dela de repressão.