O ministro do Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Moraes, em cerimônia durante as eleições de 2022 – Adriano Machado/Reuters
O presidente Jair Bolsonaro (PL) enfrentará, após a derrota na eleição, os desdobramentos dos inquéritos relatados pelo ministro Alexandre de Moraes no STF (Supremo Tribunal Federal). Moraes, cuja relação com o derrotado foi tumultuada ao longo de seu mandato, centralizou a maioria das apurações criminais contra Bolsonaro no inquérito das milícias digitais.
Desde os atos antidemocráticos em 2020, passando pelo ataque sem provas às urnas eleitorais na live de 29 de julho de 2021 e o vazamento do caso do ataque hacker ao sistema do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), até a disseminação de desinformações sobre vacinas e isolamento social durante a pandemia de Covid-19, todos esses casos estão dentro da investigação relatada por ele.
Os investigadores suspeitam que esses casos são eventos praticados por uma organização criminosa especializada em ataques às instituições e disseminação de notícias falsas e desinformação. Em ao menos dois desses eventos investigados, a PF já indicou para a prática de crime pelo presidente.
Na live de 29 de julho de 2021, por exemplo, a delegada Denisse concluiu que Bolsonaro teve atuação “direta e relevante” na produção de desinformação sobre o sistema eleitoral e aderiu “a um padrão de atuação já empregado por integrantes de governos de outros países”. Para a Polícia Federal, a “chamada live presidencial foi um evento previamente estruturado com o escopo de defender uma teoria conspiratória que os participantes já sabiam inconsistente”. A delegada também viu crime quando Bolsonaro e o deputado Filipe Barros (PL-PR) vazaram informações do inquérito que apurava o ataque hacker ao sistema do TSE.
Sob nova condução durante o período eleitoral, a investigação ganhou novos desdobramentos, como as buscas contra os oito empresários protagonistas de conversa de cunho golpista em um grupo de WhatsApp, exposta pelo jornalista Guilherme Amado do site Metrópoles, durante a campanha eleitoral. Esse e outros materiais coletados anteriormente permanecem em análise pelo delegado e sua equipe, atualmente instalada na DIP (Diretoria de Inteligência Policial) da PF.
Neste inquérito também constam análises sobre transações financeiras suspeitas no gabinete de Bolsonaro. A PF chegou nos indícios ao analisar a quebra de sigilo telemático de Mauro Cesar Barbosa Cid, principal ajudante de ordens do presidente. Foram encontradas conversas por escrito, fotos e áudios trocados por Cid com outros funcionários da Presidência que sugerem a existência de depósitos fracionados e saques em dinheiro.
O inquérito das milícias digitais tem origem na investigação dos atos antidemocráticos de 2020 e é resultado de um verdadeiro drible de Alexandre de Moraes no Procurador-Geral da República, Augusto Aras. Indicado de Bolsonaro para a PGR, Aras pediu o arquivamento do caso, que foi aceito por Moraes. O ministro, entretanto, abriu outra investigação —agora batizada de milícias digitais— utilizando o material coletado pela Polícia Federal.
Ao longo do tempo, o ministro foi enviando mais eventos para dentro da investigação. Os investigadores suspeitam que as chamadas milícias digitais têm, entre outros objetivos, “diminuir a fronteira entre o que é verdade e o que é mentira”.
“A prática visa, mais do que uma ferramenta de uso político-ideológico, um meio para obtenção de lucro, a partir de sistemas de monetização oferecidos pelas plataformas de redes sociais. Transforma rapidamente ideologia em mercadoria, levando os disseminadores a estimular a polarização e o acirramento do debate para manter o fluxo de dinheiro pelo número de visualizações”, diz relatório da PF.
A investigação aponta ainda que, “quanto mais polêmica e afrontosa às instituições for a mensagem” divulgada, “maior o impacto no número de visualizações e doações, reverberando na quantidade de canais e no alcance do maior número de pessoas”.
Com informações de Folha de São Paulo. Edição de Ju Abe.