“Em 2011, a esquerda tem que construir uma plataforma comum”

por Bárbara Mengardo, Cecília Luedemann, Débora Prado, Gabriela Moncau, Hamilton Octavio de Souza, Lúcia Rodrigues, Otávio Nagoya (*)
Entrevista CHICO ALENCAR

Carioca do bairro da Tijuca, escritor, professor de História e deputado federal pelo PSOL do Rio de Janeiro, Chico Alencar define-se como um cristão, socialista, marxista, apostólico carioca. Lutou contra a ditadura, militou no PT de 1987 a 2005. Saiu, após muitas decepções, e filiou-se ao PSOL “para continuar praticando os valores políticos que aprendemos no próprio PT”.

Nesta entrevista, o deputado fala sobre a militância partidária, as razões da sua saída do PT, sobre a participação do PSOL nas eleições presidenciais, a política de segurança pública carioca e a ocupação do Exército nos morros do Rio de Janeiro.

Para 2011, embora ache que há o risco do governo Dilma ser mais conservador do que o de Lula, que “pela sua biografia tinha que dar satisfações a um nível de demanda popular maior, tanto que não houve uma repressão aberta aos movimentos populares”, defende que a esquerda construa uma plataforma comum, que envolva a política econômica e assuma a discussão sobre a dívida pública como uma questão central, “que reduza a força do capital financeiro e que tenha a questão do controle ambiental no âmago dela. Então, aí, já dá uma boa discussão: que caminhos o Brasil vai seguir?”.

Lúcia Rodrigues – A gente gostaria que você começasse falando sobre a sua trajetória política, tudo o que você fez durante todos esses anos que está militando nessa área até agora que você foi um dos deputados federais reeleitos com maior número de votos.

Chico Alencar – Na verdade, eu fiquei nessa eleição, até para minha surpresa, graças à Caros Amigos também, em segundo lugar. Fui o mais votado, lá no Rio [de Janeiro], depois do Garotinho, que foi uma máquina avassaladora, foi exgovernador, ele apareceu em todas as propagandas do novo partido dele. Eu entendo essa última eleição como uma espécie de culminância ou de uma trajetória de vida política. Começou quando eu era ainda menino, com 16 anos, estudante em Colégio Pedro II, meados da década de 1960, já depois do golpe, participei de uma passeata e já fui em cana. Foi a minha estreia no movimento estudantil, teve prisão, dormi no quartel da Polícia Militar, em uma estrebaria com mais cem colegas e os cavalos. Mas, a partir daí eu já estava ingressando, como o Plínio [de Arruda Sampaio] tantos outros, pela sacristia, através da juventude estudantil católica. A gente tinha grupos de jovens e, curiosamente, uma pessoa ateia, minha madrinha e vizinha, me apresentou uma primeira literatura sobre o Socialismo. Me lembro muito bem o livrinho: Socialismo vivo, de um francês, Julio Monc…

Lúcia Rodrigues – Com quantos anos isso…?

Com uns 15. Um dia a minha filha caçula, que tem 17 anos, encontrou uma carta que eu escrevi para um amigo, em 1967, falando que eu queria estudar muito, porque era preciso lutar e tal… Mas, começa por aí, nessa consciência do mundo. E o regime era uma ditadura que aprofundava o seu autoritarismo. Então, tinha um inimigo muito forte para enfrentar. Por outro lado, havia uma ascensão do questionamento da burocracia socialista soviética e movimentos que, não negando o socialismo, buscavam uma renovação. Então, eu cresci nessa mistura que é muito brasileira, de um cristianismo revolucionário que volta às suas origens. Às vezes, quando me perguntam o que eu sou, eu digo: eu sou cristão, deformação católica, socialista, marxista, apostólico, porque eu sou um pregador, carioca… não sou romano. Católico, apostólico. Romano, não.

Lúcia Rodrigues – Foi via CEBs (Comunidades Eclesiais de Base) que você entrou nessa militância?

É, foi a partir da JEC (Juventude Estudantil Católica), depois as Comunidades Eclesiais de Base, que no Rio [de Janeiro], onde o Cardeal era muito conservador, ao contrário daqui que tem o Dom Paulo Evaristo Arns. Elas não se desenvolveram muito, mas mais no entorno, na baixada, que tinha o Dom Adriano Hipólito de Nova Iguaçu, que foi até sequestrado pelo CCC (Comando de Caça aos Comunistas). As associações de moradores tinham muito vínculo com essas lideranças da Igreja progressista. Eu fui presidente da associação do meu bairro, da Tijuca, e depois, acabei sendo presidente da Federação, da FAMERJ, também na primeira metade dos anos 1980. Eu fiz faculdade de História, na UFF, depois fiz mestrado em Educação na Fundação Getúlio Vargas. Então, era uma coisa boa, apesar de toda dificuldade, um regime muito fechado. Amigos presos, sumidos assim para nunca mais, muito triste, barra pesada, mas a gente tinha também alternativas.

Eu não sou fundador do PT, me filiei em 1987, porque desde aquela época achava que a autonomia dos movimentos populares e sociais era muito importante, e continuo achando. Mas, o próprio movimento comunitário foi sendo progressivamente cooptado, inclusive na era Brizola no Rio de Janeiro. E o movimento comunitário foi perdendo a sua pujança. Tudo o que fica “chapa branca”… nossos jovens da UNE tem que perceber muito isso… perde a pujança e perde a função. É um problema histórico de qualquer sociedade, é um problema que a esquerda não soube resolver bem, é o problema do socialismo que estatiza a própria dialética da sociedade e aí isso tudo perde o viço. Naquela época também se fazia concurso público, eu fiz para professor de História, em meados dos anos 1980, passei, mas não pude tomar posse, porque eu precisava do atestado ideológico. E eu tive que ser submetido a uma sabatina no DOPS, aquela casa sombria com um inspetor temido chamado Mário Borges, que me interrogou sobre o meu papel de presidente do Grêmio do Colégio de Aplicação, aos 17 anos.

Eu comecei falando da prisão, mas não mencionei o movimento estudantil, que foi uma experiência muito rica na minha vida. E ganhei a expulsão do Colégio, naquela época da ditadura tinha o decreto 477, o estudante que fosse flagrado fazendo política era expulso e ficava três anos sem poder estudar. E eu fui expulso, mas o reitor falou que como eu já estava indo para a terceira série do ensino médio, ele não ia aplicar o 477, mas eu tinha que sair do Colégio. Aí, um colégio de comunidade judaica de esquerda, “Scholem Aleichem” e o diretor que tinha sido do Partido Comunista me acolheu para eu completar o chamado segundo grau.

Gabriela Moncau – Você contou isso tudo na entrevista?

Não, ele sabia. O Mário Borges, inspetor, aquele protótipo mesmo de tira, gordão, forte, mal humorado, fiquei esperando uma hora e meia. Um professor jovem, concursado, aprovado, fica na antessala daquele prédio sombrio para ser sabatinado por um tira, truculento, torturador, muito mal afamado nos meios juvenis. Eles tinham a minha ficha completa desde a prisão em 1966, até a passagem pelo grêmio do Colégio de Aplicação. Ficou uma dúvida e eu tive que apelar para um irmão da minha mãe, que era delegado aqui do DOPS de São Paulo. Ele me chamou e passou um sermão. E aí eu consegui, afinal, depois de um ano do concurso, virar professor da rede pública. Daí que veio, nos anos 1980, o movimento comunitário, e depois, com o início dessa “abertura lenta, gradual e segura”, conquistada aos poucos pela gama de movimentos que surgia. Então, eu me filiei ao PT em 1987, tendo antes, trabalhado um pouquinho, na prefeitura do Saturnino Braga, nas primeiras eleições da prefeitura, em 1985. Mas, em 1988, aí eu, que já tinha uns 20 anos de magistério, disputei a primeira eleição.

Lúcia Rodrigues – E por que você optou pela via institucional?

Porque como estudante de História e depois como professor, eu fui percebendo que toda luta popular na história brasileira, todo movimento social significativo sempre teve também alguma inserção na institucionalidade. Nós nunca tivemos na história brasileira um movimento insurrecional, popular, com êxito e solidez de transformação que, de alguma maneira mantivesse interface com a institucionalidade. E o PT, que foi uma belíssima experiência partidária, com muitas singularidades também nesse aspecto na história brasileira, ele sempre falava do chamado tripé da vida política e partidária: um pé no movimento, outro pé na própria construção do partido, no outro, na institucionalidade, no parlamento, nos executivos. E isso durante um tempo importante da história inicial do PT, não sem contradições, foi praticado: mandatos populares, gabinetes de rua, prestação de contas públicas, audiências públicas, idas aos bairros, presenças nos movimentos, apoiando as lutas populares dos sem terra que surgem em 1985… Eu entendi que o parlamento podia ser um instrumento para ajudar esses movimentos, para ele não ser um parlamento estritamente burguês ou da reprodução do sistema dominante.

E assim foi feito e eu até fui até o mais votado do PT como vereador da cidade [do Rio de Janeiro]. Depois, naturalmente, quase teve a reeleição, e depois já em 1996, eu disputei para a prefeitura e aí começaram os problemas no PT. Então, a militância do Rio decidiu que era importante disputar a prefeitura em 1996, o partido vinha aos pouquinhos crescendo. O PDT que era um partido fortíssimo, tinha uma prática de cooptação de movimentos e de alianças com figuras da política mais espúria, mais clientelista, mais corrupta. Havia um questionamento sobre esse tipo de alianças. Entretanto, a cúpula do PT, da então Articulação, vale dizer: Zé Dirceu, Gushiken, Lula, falaram: “Não, agora a gente tem que ser pragmático e é fundamental fazer aliança com o PDT”. Isso era um problema na época. Imagina, agora, uma aliança com o PTB, com o PL, com PR, é corriqueira, está dada. E aí houve uma profunda crise: a militância num encontro, lá, lotou o ginásio da UERJ, tinha mais de 1.500 delegados, decidiu pela minha candidatura. O Vacarezza foi lá depois para tentar me convencer a desistir de ser candidato. O Lula falou que não ia dar a menor força. E aí aconteceu um fenômeno muito interessante.

Gabriela Moncau – Faltou pouco para você passar para o segundo turno.

Exatamente. Começou a campanha, ganhou um caráter de autenticidade, de combatividade, de militância, que surpreendeu todo mundo. E a gente foi crescendo, crescendo, crescendo, uma coisa impressionante… Aí, na antevéspera, a gente fez um comício na Cinelândia. Naquela época, tinha comício com militância. E o Lula apareceu, fez uma autocrítica pública, disse que não tinha apostado, mas a força da base… Foi muito bonito. E aí, por 1,5% a gente não foi para o segundo turno. Mas, foi muito bonita a campanha. Só que perdemos.

Eu fui eleito deputado estadual em 1998, mais votado do PT do Rio de Janeiro, exatamente como resultado dessa campanha à prefeitura, fiquei com um nome mais conhecido e lá a crise do governo Garotinho. Continuamos no PT do Rio de Janeiro com esse tom mais independente, de partido mais classista, mais combativo, mais aguerrido. E, assim, chegamos à campanha do Lula. A partir daí surgiu um outro movimento no Brasil, muito expressivo, que é o Movimento Nacional Fé e Política, que reúne a cada dois anos, e tem muita gente do PT ainda. Eu lembro que o Lula foi a um encontro de Fé e Política lá em Poços de Caldas e já tinha aquele papo de vice José Alencar. Depois ele ficou até progressista, o único que batia nas altas taxas de juros, na política econômica. Mas, fomos para a campanha. E aí essa eleição do Lula me lembra uma música do Caetano, chamada Dedé Mamata, que lá pelas tantas nos versos geniais, dizia assim: “O sonho já tinha acabado quando eu vim/ E cinzas de sonhos desabam sobre mim.” Aí, outra crise: contratação do Duda Mendonça…

Hamilton Octavio de Souza – … que já tinha sido marqueteiro do Maluf, anos anteriores.

Claro. Mas, o pessoal da Articulação, do campo majoritário, falava: “Isso mesmo, para você ver, o cara elege o Maluf, então, já pensou ele com essa capacidade toda, aqui, conosco?” E perguntavam: “Mas, e o dinheiro?” Aí, entrou o Delúbio e começaram esses esquemas todos. Bom, vencemos a eleição e ainda tinha a aposta, a teimosia da esquerda. Ninguém tinha a ilusão de que o Lula ia decretar o Socialismo, a gente não era mais ingênuo, mas a gente achava que ia ser um governo de mudanças. E, aí, começa um processo que, de novo, gerou rupturas sucessivas, mas emtempos diferenciados. Meirelles no Banco Central.

A essa altura, o José Alencar começava a falar: “Tem que diminuir os juros, combater a política econômica ortodoxa.” A gente começou a achar o Zé Alencar mais progressista que o próprio Lula. E a ortodoxia, o continuísmo, claro tinha sido a nossa Carta aos Brasileiros. O Palocci, ministro da Fazenda com a banca internacional… Então, começou a gerar muita crise. Veio a reforma da Previdência. Era paradoxal, com cinco meses do governo Lula, você achando que ia ser um governo que ia mobilizar força social de mudança que, embora já declinante… Mas a vitória do Lula dava esperanças, mas o governo começa a ter práticas inteiramente contraditórias com tudo o que a história do PT, inclusive na Frente Institucional Parlamentar, como a gente chamava, negava: a reforma da Previdência, que o PT enfrentou na era Fernando Henrique Cardoso, e aí o Lula propõe… E isso foi uma crise profunda que gerou a saída daquela primeira leva: Heloísa Helena, Luciana Genro, Babá, o João Fontes. E nós continuamos, mas fomos suspensos. Eu lembro que a gente não votou na reforma da Previdência, mas fez abstenção. Então, as coisas foram crescendo até que vem o mensalão e toda o esquema do PT de financiamento de campanha, sobretudo isso, e de acordos com o PL, depois PR, de Valdemar Costa Neto.

Quando tudo isso começa a vir à tona, a crise se aprofunda. Aí eu me lembro que uma vez, já em 2004, dois anos do governo Lula, e nós ainda no PT, já começava a surgir esse zumzum de muito dinheiro, de onde vinha tanto dinheiro… E eu propus, o tesoureiro era o Delúbio, que em 2004, que a gente desse um exemplo: transparência total, cada centavo que entra para a campanha a gente vai publicizar on line, já tinha esses mecanismos, no decorrer da própria campanha. E o Delúbio, foi aí que ele cunhou uma frase que ficou famosa, tinha fonte de financiamento, caixa 2, que não eram publicáveis. E quando vem a CPI do Mensalão, a gente descobre que o Duda Mendonça falou que ele tinha recebido uma parte significativa, se não me falha a memória, de 10 milhões de reais ou de dólares, das Ilhas Caymán, paraíso fiscal. Aí ruiu. E foi muita gente que estava ao lado, lá na Câmara, foi à tarde, a gente no plenário, a gente chorou, tem uma foto também que registra esse movimento. A gente escreveu um cartaz também: “Não em nosso nome !” E aí foi um desastre. Foi o momento mais doloroso depois do enfrentamento da ditadura, porque é um golpe, é uma frustração. Eu gosto muito de música, eu vou fazendo uma espécie de trilha sonora da minha vida. Num documento que eu fiz na minha saída do PT que na Câmara eles chamam de separata, foi um discurso, de título: “Mudar de enxada para continuar o plantio”.

Só no plano federal, centenas vão migrar, militantes frustrados, lá no plano federal, a deputada Maninha, o João Alfredo, do Ceará, o Orlando Fantazini, daqui, como Ivan Valente, também, e eu do Rio de Janeiro, já tinha Luciana Genro, o Babá, João Fontes, Heloísa Helena do Senado. Então, foi um grupo grande, expressivo, de gente séria, autêntica, que fez essa escolha que é muito difícil. A gente fez plenárias com 300, 400, 500 pessoas para discutir: sai ou não sai, fica ou não fica. E houve uma maioria, digamos que de 65 para 35, 60 para 40, pela saída do PT. Foi difícil, foi dolorosa. E vieram convites para entrar: PSB, PPS, PV, PDT, PCdoB, esses partidos mais progressistas queriam esses quadros políticos mais conhecidos, mas nós falamos: “Não, então é melhor ficar no PT, trocar seis por meia dúzia.” E aí ingressamos no PSOL que já tinham os seus fundacionais ali, mas, ainda sem disputar nenhuma eleição.

Lúcia Rodrigues – E por que você ingressou no PSOL? O que você viu de diferente em relação aos outros partidos de esquerda?

Eu acho que aí, pelo nosso processo no PT, o PSOL abria possibilidades de construção que retomava alguns valores do PT. A gente até falava muitas vezes: “Nós saímos do PT para continuar praticando os valores políticos que aprendemos no próprio PT, e que agora no PT de hoje não são viáveis de se praticar, você tem que fazer um nível de concessão que te ofende, te agride, te choca, te bate, não dá, é insustentável. E os outros partidos tem os mesmos vícios, partidos que vão sendo corrompidos pela institucionalidade, que é cada vez mais forte”. A gente acreditava que o PSOL, ainda uma aposta, poderia abrir essa possibilidade, mas é duríssimo. O PSOL que tem só cinco anos de vida é um partido que ainda não se consolidou, um partido pequeno com vocação de grandeza. A gente pretende fazer boa política. E tem problemas. O PSOL tem muitas correntes. Esse ano que está acabando agora [dezembro de 2010], chegamos num nível de conflagração que eu pensei que o partido ia acabar. Tínhamos claro como figura proeminente a Heloísa Helena e há também quem diga que partido político no Brasil que não tiver uma figura fortemente carismática, não se afirma nacionalmente. É uma meia verdade, a realidade mostra um pouco isso. O Lula é muito maior que o PT e a Heloísa é uma figura que tem também esse carisma, essa capacidade de se inserir no imaginário popular. Mas, o PSOL tinha essa joia preciosa da figura pública da Heloísa Helena e assim disputamos a nossa primeira eleição. E, incrível, do ponto de vista da eleição majoritária, foi a terceira colocada. Foi uma novidade que surgiu no cenário. Conseguimos, não é fácil nos esquemas cada vez mais endinheirados da campanha fazer três deputados federais. Ou seja, em 2006, o PSOL sobreviveu.

O PSOL no imaginário da parcela da população que identifica a legenda, tem uma boa figura, que agora com essa eleição de 2010 eu acho que se confirmou. O próprio papel do Plínio cuja candidatura, internamente, foi muito contestada, foi essa conflagração insana… Eu, em maio, falava: “Não sobreviveremos, estamos na beira do precipício.” Teve uma disputa interna: três pré-candidatos de um partido pequenininho. Mas, felizmente, conseguimos consolidar uma candidatura, o Plínio com a sua história de vida. Ele, claro, teve uma votação muito menor que a Heloísa, que fez em torno de 6 milhões de votos, o Plínio fez 900 mil, entretanto, a votação na legenda e nas eleições proporcionais para o PSOL se manteve a mesma. O Ivan [Valente], aqui em São Paulo, não tinha a menor chance, eu no Rio de Janeiro ia ter que suar na camisa, muito, pelas dificuldades do partido, tempo de TV, essa disposição de não aceitar o financiamento de empresas. Fazer uma campanha na contramão do modelo político vigente. E, no entanto, continuo achando que nós sobrevivemos. E o Plínio, que era uma figura que a maioria não conhecia, pela massificação da televisão, era o velhinho maluquinho. Lá no Rio de Janeiro ele arrastou multidões de jovens, quando teve um circuito universitário, fez uma bela figura, questionando, contestando. O Plínio era um provocador, no sentido de resgatar a dimensão do debate político. Ele colocava questões que incomodavam a Dilma e a própria Marina. Mas, claro, a gente sabia que expressão eleitoral grande não teria. O PSTU e mesmo o PCB quase fizeram aliança, mas a coisa gorou, faltou cinco minutos para registrar as candidaturas. Na verdade, se fosse a Heloísa, todos estariam juntos.

Lúcia Rodrigues – Você acha que o governo Dilma vai tentar cooptar os movimentos sociais?

Olha, o Lula, pela sua própria história, pela sua formação política, ele tinha isso no sangue. Ele tinha, inclusive, uma eficácia nessa cooptação extraordinária e imensa. Com a Dilma será muito ais difícil. O estilo é totalmente diferente. A Dilma tem lá na sua juventude uma história de luta contra a ditadura, é torturada 22 dias e é uma mulher, tem essa singularidade. Eu não diria que são desprezíveis e irrelevantes, mas o governo dela é de continuidade. Essa comunicação com a população faz com que o cidadão comum, inclusive despolitizado, se identifique: “O Lula sou eu. Eu sou um Silva, também. A diferença é que ele é um ex-pobre, mas que continua sabendo o que é a vida da pobreza: “eu continuo pobre, aqui, mas deu uma melhoradinha, comprei até uma geladeira nova.” Porque houve uma pequena movimentação em termos de mobilidade social, embora o país continue com problemas gravíssimos, terríveis, da desigualdade social, abissal, das regiões metropolitanas que são o caos do ponto de vista da vida, da mobilidade humana.

Fonte: Caros Amigos

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