Declaração sobre o estado do planeta, elaborada por mais de 3 mil cientistas reunidos em Londres, propõe relações mais estreitas entre ciência e sociedade para evitar emergência humanitária em escala global
O funcionamento do sistema terrestre que viabilizou a civilização nos últimos séculos está ameaçado e o resultado disso poderá ser uma emergência humanitária de escala global, com a intensificação das crises sociais, econômicas e ambientais. As ações amplas e urgentes necessárias para reverter esse cenário só serão viáveis com o estabelecimento de um novo pacto entre a ciência e a sociedade, com maior conectividade entre as lideranças de todos os setores.
Essa é a principal conclusão da Declaração sobre o estado do planeta, divulgada nesta quinta-feira (29/03) depois de intensos debates envolvendo cientistas especializados em temas socioambientais, durante a reunião Planet Under Pressure, realizada em Londres (Inglaterra) entre 26 e 29 de março.
O documento sintetiza a posição da comunidade científica em relação aos temas da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (RIO+20) e foi elaborado com o objetivo de influenciar a agenda de discussões e as decisões que deverão ser tomadas durante a conferência. A RIO+20 será realizada no Rio de Janeiro entre os dias 20 e 22 de junho.
O evento em Londres foi organizado pelos quatro programas da Organização das Nações Unidas (ONU) voltados para a área ambiental: International Programme of Biodiversity Science (Diversitas), International Human Dimensions Programme on Global Environment Change (IHDP), World Climate Research Programme (WCRP) e International Council of Scientific Unions (ICSU).
Durante o evento, as intrincadas conexões entre todos os diferentes sistemas e ciclos que governam o oceano, a atmosfera, os sistemas terrestres e a vida humana e animal que depende desses ambientes foram discutidas por mais de 3 mil especialistas em temas como mudança climática, geoengenharia ambiental, governança internacional, futuro dos oceanos e da biodiversidade, comércio global, desenvolvimento, combate à pobreza e segurança alimentar.
De acordo com Lidia Brito, copresidente da conferência e diretora da divisão de Políticas Científicas da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), na declaração os cientistas reconhecem a complexidade e a urgência dos desafios da atualidade e propõem uma nova visão da ciência em relação à sustentabilidade global.
“Temos uma mensagem positiva: com uma forte liderança em todos os setores e com o aproveitamento da crescente conectividade, temos a esperança de que o risco de uma crise ambiental de longo prazo seja minimizado”, disse Lidia Brito à Agência FAPESP.
Segundo ela, que também é ex-ministra da Ciência de Moçambique, os cientistas apoiam o conceito de economia verde, reconhecendo que, com a globalização, as economias, as sociedades e a sustentabilidade ambiental e social são altamente interconectadas e interdependentes.
“Essa nova conectividade é o início do caminho pelo qual a comunidade científica precisa operar. Nós precisamos de uma poderosa rede de inovação envolvendo o Norte e o Sul. Essa abordagem precisa fazer parte do nosso DNA a partir de agora”, disse Lidia Brito.
De acordo com a declaração, cresce cada vez mais o consenso na comunidade científica em relação à passagem do planeta para uma nova era – o Antropoceno – na qual muitos processos de escala planetária são dominados pelas atividades humanas. Os cientistas concluem que a sociedade não tem mais condições de adiar a tomada urgente de ações em larga escala. “O tempo é o recurso natural mais escasso de todos. Nós precisamos mudar o curso das coisas de uma maneira fundamental nesta década”, afirmou Lidia Brito.
Segundo a declaração, a alta interconectividade da sociedade contemporânea pode ser aproveitada para estimular as inovações em uma velocidade sem precedentes. Mas, para isso, será preciso disponibilizar um acesso mais aberto ao conhecimento, o PIB deverá deixar de ser a única medida de progresso e será preciso estabelecer novos paradigmas de trabalho em cooperação internacional.
Para que seja possível uma administração planetária mais eficaz, também será preciso desenvolver novos modos de participação em todos os níveis, lideranças mais fortes em todos os setores da sociedade e maior conectividade entre os que geram novos conhecimentos e o resto da sociedade. Será preciso, ainda, repensar os papéis da ciência, da política, da indústria e da sociedade civil.
Mais informações: http://www.planetunderpressure2012.net
Matéria da Agência FAPESP, publicada pelo EcoDebate, 02/04/2012
4 respostas para “Declaração sobre o estado do planeta | Comunidade científica faz recomendações para a Rio+20”
“Será preciso, ainda, repensar” Belo monte, Tucuruí (hidrelétrica) e a Amazônia como um todo, pois se não pensarmos no autofagismo capitalista não adianta repensar…
O atraso da Amazônia, representado pelos indígenas, foi o que a preservou. Já o avanço do mundo ocidental tem demonstrado sua derrocada a partir do que se assiste na Grécia, aliás berço de nossa civilização. Ou seja, os conceitos parecem falidos ou trocados. Sendo assim elite como significado e significante, de onde emana a ordem das coisas, certamente é o grande entrave para repensar o mundo, do contrário, tudo não passa de dissimulação para manter a natureza sob o capricho humano (machista, sobretudo) e toda discussão é cena para manter o status quo capitalista…
A emergência humanitária certamente já é pensada em escala global. Pois das duas saídas possíveis para a humanidade se livrar desse dilema, uma delas é tomar a liberdade das pessoas, além de considerar a simbiose de cientista e sociedade, como condição para uma nova sociabilidade. Pois, se os conceitos de civilização surgidos no mundo grego estão falidos, podemos apontar, sem titubear, que esta civilização (a nossa) começa a prognosticar o seu fim. Assim os Doutores encontram-se em grandes aporias, Os mestres titubeantes e os políticos profissionais estonteantes. Tudo que o capitalismo precisava para guiar as elites no rumo da insustentabilidade. É com esta mesma ciência que se fala em desenvolver a Amazônia?
“PUTA-QUE-PARIU”, caro Sinderlei!!! Foi na mosca. Pela Amazônia. Pela liberdade…