
Arquiteto e professor pesquisador, Edmilson Rodrigues pré-lançou em noite de autógrafos no dia 25.04, o livro “Território e Soberania na Globalização – Amazônia, Jardim de Águas Sedento”. O livro é baseado em sua tese de doutorado defendida em 2010 e aprovada com conceito excelente, distinção e louvor e foi publicada pela Editora Fórum, de Belo Horizonte – MG, no ano passado. No próximo dia 04 de maio, o livro será lançado na XVII Feira Pan-Amazônica do Livro, no estande de Escritores Paraenses, no Hangar – Centro de Convenções e Feiras da Amazônia.
A obra deveria ter sido lançada no ano passado, na XVI Feira Pan-Amazônica do Livro, mas uma decisão arbitrária por ordem do secretário de Estado de Cultura do governo do PSDB, Paulo Chaves, obrigou a suspensão do lançamento. O alvo da ação arbitrária contra o autor foi motivada pelo fato de Edmilson ser candidato à prefeitura de Belém na época, representando o campo de esquerda.
Doutor em Geografia Humana pela Universidade de São Paulo (USP), Edmilson Rodrigues, que também é deputado estadual pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), analisa nas 569 páginas do livro a relação entre globalização e soberania territorial. De forma profunda, o autor lança seu olhar científico sobre o fenômeno da apropriação privada dos recursos hídricos do território na Amazônia, região fundamental para a manutenção do planeta. Os pontos mais importantes da análise do autor podem ser conferidos na entrevista a seguir, publicada originalmente no Portal ORM, em 25.04.13.
Leia a entrevista:
Do que trata o seu novo livro?
Analiso, no atual período histórico da globalização, a soberania territorial, tomando como base o uso do território através de eventos já realizados ou em realização, que são significativos para a interpretação dos constrangimentos que impactam a soberania territorial no processo de reconfiguração e refuncionalização do território. Para isso, analisei o fenômeno da apropriação privada dos recursos hídricos do território, em especial os eventos sucedidos na Amazônia, nosso jardim de águas, destacando os usos territoriais não-hegemônicos, que se constituem em formas de resistência dos lugares.
Que eventos mereceram destaque em sua análise?
Entre outros eventos expressivos a usina hidrelétrica de Belo Monte, pela grandiosidade desse sistema de engenharia e seu potencial no processo de reconfiguração espacial, pois a instalação de sistemas técnicos – verdadeiras próteses – no território, não aconteceria sem um conjunto de agentes normativos baseados em uma geopolítica que expressa os interesses de países ricos, de corporações oligopolistas, das classes hegemônicas, sobretudo os agentes do capital financeiro.
Que agentes são esses?
Destaco as gigantescas corporações que atuam com a exploração dos recursos hídricos (sistemas de abastecimento de água, hidrelétricas etc.) que são representados por uma espécie de “santíssima trindade” financeira da globalização: o Banco Mundial (BIRD), o Fundo Monetário Internacional (FMI) e a Organização Mundial do Comércio (OMC).
Qual o papel dessa “santíssima trindade financeira da globalização”?
Essas instituições multilaterais da ONU exercem de forma articulada papel fundamental na normatização do território a fim de torná-lo dócil ao uso mercantil de seus recursos, constrangendo, assim, a soberania. Essa tríade, composta por agências das Nações Unidas, ganha facilidades do Estado brasileiro no relacionamento com os governos dos Estados territoriais, garantindo, entre outras coisas, a aprovação de dispositivos normativos legais constitucionais ou infraconstitucionais conforme a sua conveniência.
Então, se pode falar que o princípio da soberania do estado territorial está superado?
Não, ao contrário. Apesar dos que se julgam portadores do “pensamento único” defenderem a tese do fim da soberania, esta permanece existindo, pois os eventos exogenamente planejados necessitam do estado nacional para tornarem-se normas nos territórios. A globalização, portanto, não eliminou o sentido de permanência do direito dos povos à autodeterminação e à soberania territorial. Ao contrário, a fragmentação imanente ao processo de globalização reacende a ideia de fronteiras e de estados territoriais.
Mas a globalização não torna mínimo o papel do estado?
Mostro que é uma ideologia a tese da “desterritorialização” dos estados, que não mais teriam a função de exercício do poder soberano. Ora, para além da ideologia, o território usado é uma totalidade dinâmica e contraditória, disputado por todos (instituições, trabalhadores, empresários) e é, também, todo o espaço. É o que Milton Santos conceitua como “espaço banal”, pois na globalização atual são as normas definidas pelas empresas que determinam os usos predominantes no território, visando o lucro. Contudo, há usos populares do território, movidos pela necessidade de bem-estar, que baseiam-se em racionalidades alternativas à do capital. Por isso, destaco a crise dessa ideologia, já que são notórias as resistências indicativas de que uma outra globalização é possível e já vem sendo constituída pelos que querem o território como abrigo, como bem social, sobretudo a água que é, por definição, uma não-mercadoria.
De que modo a privatização dos recursos hídricos assume importância estratégica para esses agentes no período da globalização?
Provei que as resoluções da Conferência de Dublin realizada pela ONU em 1992, ao definir a água como “bem econômico”, logo “precificável”, a fim de ser vendido como qualquer bem mercantil, serviram para orientar o trabalho de normatização do território a fim de tornar legítima internamente essa estratégia dos países ricos e suas gigantes corporações. A partir daí, os governos, domados por essa ideologia, passam, em nome da modernização do país, a protagonizar reformas normativas legitimadoras da entrega ao “livre mercado” de nossos recursos hídricos.
Uma resposta para “Edmilson Rodrigues | O autor lança seu olhar científico sobre o fenômeno da apropriação privada dos recursos hídricos do território na Amazônia”
Uma releitura de “A Riqueza das Nações”, de Adam Smith, incluindo a “biodiversidade”, colocaria o Brasil, em geral, e a Amazônia, em particular, como agente principal de uma nova maneira de estar no mundo, onde os recursos hídricos contam também com uma riquíssima biodiversidade, entre outros valores. O “livre mercado”, possivelmente, fomentará a mesma questão de “guerra religiosa” que ocorre no oriente médio em torno das regiões que contém algum curso d’água, num processo histórico de dominação. O que, no entanto, não pode ocorrer sem a colaboração do estado comprometido com a política nefanda tríade (BIRD + FMI + OMC), citada pelo professor. Sem esquecer de atentar para o fato que o “cara” (ou operário padrão/ex-presidente Lula), que talvez seja o cicerone para o trio referido, esteja sendo recompensado com títulos de doutor honoris causas por países falidos, e correspondentes em alguns jornais, entre outros mimos, como ocorria com os nativos à época da invasão destas terras, para manter subservientes serviços à burguesia capitalista falida.