Chamados para o Seminário Mundial contra a contrução da usina hidrelétrica de Belo Monte, Senadora Marinor Brito e deputado Edmilson Rodrigues, participam do debate e acompanham mobilizações contrárias à construção de barragem na volta grande do Xingu
O sol ainda não tinha raiado na floresta, pouco antes das 5 horas da manhã desta quinta-feira (27), quando o grito de guerra de caciques e guerreiros de 18 etnias começava a ecoar. Lado a lado com pescadores e ativistas de movimentos sociais, sindicais, juventude e de ambientalistas vindos dos mais variados lugares da Amazônia, interditaram por mais de 12 horas a rodovia Transamazônica, na altura do Km 50, em Vitória do Xingu (cerca de 950 Km de Belém), em frente às instalações da Norte Energia e em seguida ocuparam o canteiro de obras da empresa.
– Estamos muito tristes com a presidenta do Brasil. Ela, está fazendo muita coisa errada para nosso povo e esperamos que a justiça em Brasília, pare imediatamente Belo Monte. Se não parar, nos estamos prontos para ir lá e parar e queremos compartilhar com os parlamentares do PSOL a nossa indignação e estender esse convite, pois, não toleramos mais a exploração e a enganação do nosso povo, pois é assim que os governos brasileiros têm tratado os índios durante séculos. Se a caneta não resolver, nos usaremos a força que dispomos para parar Belo Monte imediatamente, disseram em tom de convocação, os caciques.
Em sua fala, a senadora Marinor Brito respondeu ao chamados das lideranças indígenas e deixou claro que a luta para parar Belo Monte é uma das questões de maior interesse do mandato no Congresso Nacional.
– Um dos meus primeiros pronunciamentos foi para desmascarar a farsa de Belo Monte e quero deixar claro e no que depender do nosso mandato no senado federal, continuaremos cobrando do governo brasileiro o respeito à vida e ao direito indiscutível dos povos da Amazônia de viverem no Rio Xingu. Não abrimos mão de lutar pela preservação de rios e florestas, condição essencial para a sobrevivência dos amazônidas brasileiros. Fora usina Belo Monte da nossa região! Xingu vivo para sempre! Viva os povos tradicionais!, disse, emocionada, a senadora do PSOL.
Em tom de desabafo e indignação, o deputado Edmilson Rodrigues usou da palavra para ajudar na resistência contra a construção da usina de Belo Monte e afirmou que é companheiro de lutas e está a disposição para resistir juntamente com os povos da florestas à violência do Estado brasileiro.
A resistência indígena é um exemplo de que o povo pode exercer o poder em benefício da grande maioria da população, do povo decidir seu próprio futuro. É por isso, que eles [governo e elite econômica] querem destruir a resistência dos povos da florestas. É por isso que alguns órgãos de comunicação não vão divulgar a violência que os índios estão sofrendo no rio Xingu, porque eles querem dizer para todo mundo que está todo mundo feliz com a construção da usina de Belo Monte. E dizem que em Altamira o povo está feliz, porque vai gerar emprego, trazer felicidade e nós sabemos que isso é mentira. Quem não for rico vai ficar sem casa própria, porque a especulação imobiliária já começou, as crianças já estão fora da escola e que não tem plano de saúde vai morrer nas portas das unidades públicas de saúde. Eles são muitos fortes, mas a nossa capacidade de luta é muito maior, de resistência, de rebeldia, de não aceitar sob hipótese alguma, ver os nossos curumins passando fome nas ruas ou sendo vítima da violência sexual. Vamos à luta contra a construção de Belo Monte e podem contar com nosso mandato parlamentar nessa difícil tarefa em que a resistência é o primeiro passo para sermos vitoriosos, disse Edmilson.
ANÁLISE: BALANÇO POSITIVO
“Saímos de cabeça erguida, fortalecidos. Saímos não por decisão da justiça ou
da meia dúzia de policiais que estão a serviço do grande capital.
Saímos porque a missão que nos demos foi cumprida”
Para Fernando Carneiro, do PSOL e do Comitê Metropolitano do Movimento Xingu Vivo Para Sempre, a radicalização da luta foi um acerto. Segundo Carneiro, há muito que o Brasil e o mundo esperam por um gesto mais enfático contra a construção de Belo Monte. Durante mais de 12 horas o povo mostrou que a luta continua. Que Belo Monte não é um fato consumado.
– Saímos de cabeça erguida, fortalecidos. Saímos não por decisão da justiça ou da meia dúzia de policiais que estão a serviço do grande capital. Saímos porque a missão que nos demos foi cumprida. O recado foi dado: não aceitaremos essa obra faraônica e falaciosa, disse Fernando.
O dirigente do PSOL, afirmou ainda que a ocupação inaugura uma nova fase da luta.
– Agora é o momento de nos fortalecermos na própria região. Devemos intensificar o processo de organização e de conscientização da população local que já sente na pele os impactos dos grandes projetos. Ao mesmo tempo temos que falar para fora, para milhares e milhões que estão indignados com a teimosia de Lula e Dilma. A batalha é dura, mas imbuídos da sabedoria milenar de nossos ancestrais, os índios, venceremos. O vigoroso grito de guerra que lançamos aqui, ecoará por todos os cantos do planeta: PARE BELO MONTE!, disse Carneiro.
Declaração da Aliança do Xingu contra Belo Monte
“Não permitiremos que o governo crie esta usina e quaisquer outros projetos que afetem as terras, as vidas e a sobrevivência das atuais e futuras gerações da Bacia do Xingu”
Nós, os 700 participantes do seminário “Territórios, ambiente e desenvolvimento na Amazônia: a luta contra os grandes projetos hidrelétricos na bacia do Xingu”; nós, guerreiros Araweté, Assurini do Pará, Assurini do Tocantins, Kayapó, Kraô, Apinajés, Gavião, Munduruku, Guajajara do Pará, Guajajara do Maranhão, Arara, Xipaya, Xicrin, Juruna, Guarani, Tupinambá, Tembé, Ka’apor, Tupinambá, Tapajós, Arapyun, Maytapeí, Cumaruara, Awa-Guajá e Karajas, representando populações indígenas ameaçadas por Belo Monte e por outros projetos hidrelétricos na Amazônia; nós, pescadores, agricultores, ribeirinhos e moradores das cidades, impactados pela usina; nós, estudantes, sindicalistas, lideranças sociais e apoiadores das lutas destes povos contra Belo Monte, afirmamos que não permitiremos que o governo crie esta usina e quaisquer outros projetos que afetem as terras, as vidas e a sobrevivência das atuais e futuras gerações da Bacia do Xingu.
Durante os dias 25 e 26 outubro de 2011, nos reunimos em Altamira para reafirmar nossa aliança e o firme propósito de resistirmos juntos, não importam as armas e as ameaças físicas, morais e econômicas que usaram contra nós, ao projeto de barramento e assassinato do Xingu.
Durante esta última década, na qual o governo retomou e desenvolveu um dos mais nefastos projetos da ditadura militar na Amazônia, nós, que somos todos cidadãos brasileiros, não fomos considerados, ouvidos e muito menos consultados sobre a construção de Belo Monte, como nos garante a Constituição e as leis de nosso país, e os tratados internacionais que protegem as populações tradicionais, dos quais o Brasil é signatário.
Escorraçadas de suas terras, expulsas das barrancas do rio, acuadas pelas máquinas e sufocadas pela poeira que elas levantam, as populações do Xingu vem sendo brutalizadas por parte do consórcio autorizado pelo governo a derrubar as florestas, plantações de cacau, roças, hortas, jardins e casas, destruir a fauna do rio, usurpar os espaços na cidade e no campo, elevar o custo de vida, explorar os trabalhadores e aterrorizar as famílias com a ameaça de um futuro tenebroso de miséria, violência, drogas e prostituição. E repetindo assim os erros, o desrespeito e as violências de tantas outras hidrelétricas e grandes projetos impostos à força à Amazônia e suas populações.
Armados apenas da nossa dignidade e dos nossos direitos, e fortalecidos pela nossa aliança, declaramos aqui que formalizamos um pacto de luta contra Belo Monte, que nos torna fortes acima de toda a humilhação que nos foi imposta até então. Firmamos um pacto que nos manterá unidos até que este projeto de morte seja varrido do mapa e da história do Xingu, com quem temos uma dívida de honra, vida e, se a sua sobrevivência nos exigir, de sangue.
Diante da intransigência do governo em dialogar, e da insistência em nos desrespeitar, ocupamos a partir de agora o canteiro de obras de Belo Monte e trancamos seu acesso pela rodovia Transamazônica. Exigimos que o governo envie para cá um representante com mandado para assinar um termo de paralisação e desistência definitiva da construção de Belo Monte.
Altamira, 27 de outubro de 2011