[Dion Monteiro]
É possível que no imaginário nacional esteja gravado que as maiores cidades da Amazônia, Belém e Manaus, sejam metrópoles com grande arborização urbana. Se esta hipótese for verdadeira, o estudo divulgado em maio deste ano pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) põe por terra esta crença.
A pesquisa, que teve como universo 15 grandes cidades brasileiras, como Goiânia, Campinas e Belo Horizonte, além de Belém e Manaus, todas com mais de 1 milhão de habitantes, apontou as capitais amazônicas como aquelas com menor percentual de arborização em áreas públicas, Manaus com 25,1% e Belém com 22,4%. Goiânia, com 89,5%, foi identificada como a cidade mais arborizada entre as 15 estudadas.
O resultado desta pesquisa vai ao encontro de outros dados apresentados anteriormente.
O livro Belém Sustentável, publicado em 2003 pelo Instituto do Homem e Meio-Ambiente da Amazônia (Imazon), informa que no ano de 2001, ou seja, há mais de 10 anos, as áreas verdes da Grande Belém (Ananindeua, Belém, Benevides, Marituba e Santa Bárbara) já representavam apenas 33% de seu território total.
Em 2010 o Museu Paraense Emílio Goeldi (MPEG) divulgou um estudo mostrando que Belém já havia perdido, até aquele momento, 85% de sua vegetação original. O estudo utilizou imagens de alta resolução de satélite, tendo sido realizado pela pesquisadora Surama Munhoz, com a orientação do também pesquisador Leandro Ferreira. O estudo concluiu que se a redução de áreas verdes continuar nesse ritmo, entre 10 e 15 anos toda a vegetação original acabará.
Estas constatações são graves, pois as florestas urbanas, parques, unidades de conservação, praças e outras áreas verdes, maiores ou menores, cumprem uma função determinante para o desenvolvimento da vida na urbe.
É por este motivo que um processo de urbanização que não leve em consideração estes espaços, não representa a cidade que queremos, e precisamos.
Em uma cidade tropical como Belém, é fácil deduzir que as áreas verdes tem a função de manter e regular o equilíbrio climático, amenizando os impactos do clima quente e úmido. Porém, esta não é a única função destas áreas. Pode-se considerar também a proteção de espécies animais e vegetais; conservação de fontes de recursos hídricos; propiciar áreas de lazer e esporte; reduzir impactos provenientes da emissão de gases poluentes; atuar em aspectos paisagísticos, entre outros.
Como forma de superar o conflito existente entre natureza e urbe, contradição induzida por políticas públicas equivocadas ou ausentes, duas lógicas podem e devem ser desenvolvidas, a manutenção e fortalecimento das áreas verdes ainda existentes e a criação de novas áreas verdes em Belém.
Nesse sentido, o processo que elevou o bosque Rodrigues Alves a categoria de Jardim Botânico, no ano de 2002, fortaleceu este espaço público e facilitou, inclusive, a captação de recursos, algo que até o momento foi pouco explorado. Os recursos, se conseguidos, poderiam ser investidos na recuperação de áreas degradadas, mas também no desenvolvimento de pesquisas que certamente fortaleceriam a proteção ambiental do bosque.
Em 2003, outra ação poderia ter trazido resultados bastante positivos para a cidade, trata-se da criação da Secretaria Municipal de Meio Ambiente (SEMMA) e do Conselho Municipal de Meio Ambiente (CONSEMMA), ambos criados através da Lei Ordinária N.º 8.233 de 31 de janeiro/2003. O problema é que a falta de compromisso e capacitação técnica da atual administração municipal não possibilitou a esta secretaria desenvolver um plano consistente e de longo prazo, onde natureza e urbe não fossem postos em contradição, mas sim em cooperação e complementação.
Uma gestão eficiente, capacitada e comprometida com a cidade, certamente potencializaria as estruturas existentes, SEMMA, Escola Bosque, Jardim Botânico, outras. Pensando programas e projetos, captando recursos nacionais e internacionais, procurando superar as grandes dificuldades hoje existentes nesse tema.
Ao contrario, uma administração comprometida somente com os interesses de políticos corruptos e empreiteiras, vultosas financiadoras de campanhas, sempre privilegiará estes grupos, mesmo que isso signifique autorizar obras em locais impróprios, como na orla de Belém, sem estudos de impacto ambiental e apresentando riscos sanitários, acústicos e de ventilação à cidade e seus habitantes.
A cidade que queremos conecta os aspectos sociais, ambientais e infraestruturais. A cidade que queremos não privilegia o cimento e o lucro, privilegia as pessoas, a flora, a fauna, a vida. A cidade que queremos agrega a natureza e a urbe.
Dion Monteiro é Pesquisador do Instituto Amazônia Solidária e Sustentável (IAMAS)
2 respostas para “Opinião | Belém: natureza e urbe em conflito”
O melhor exemplo disso é o bosque Rodrigues Alves sendo sufocado. Sua visão panorâmica é deprimente. Mas a visão mais chocante são os atropelamentos, assassinatos por armas de fogo e falta de atendimento médico e alimentar, pois o ser humano é a Natureza em pessoa…
Um exemplo disso é o bosque Rodrigues Alves sendo sufocado. Sua visão panorâmica é deprimente. Mas a visão mais chocante são os atropelamentos, assassinatos por armas de fogo e falta de atendimento médico e alimentar, pois o ser humano é a Natureza em pessoa…