Neymar chora muito e é consolado por Raphinha, após derrota do Brasil para a Croácia, nas quartas de final da Copa Fifa 2022 (Hannah Mckay/Reuters)
A despeito das diversas e respeitáveis análises técnicas sobre a seleção de Tite, publicadas nos maiores portais esportivos do planeta desde a derrota do Brasil nesta amarga sexta-feira, 9 de dezembro de 2022, no Catar, quero atentar-me sobre um único fato, que, a meu ver, é imprescindível: no comando deste time está um líder- Neymar.
O líder que é apoiador ferrenho daquilo que nós, os brasileiros e brasileiras aos quais ainda resta alguma racionalidade, nos envergonhamos mais, daquilo que nos faz amargar a dor de ter que admitir que não somos, afinal, um país civilizado no sentido pleno da palavra, apesar de nosso clima e praias paradisíacas, nossa arte e nossa cultura tão enaltecidas no exterior, nossa diversidade, nosso povo miscigenado e belo. Quero me deter nesta temática: o sentido do “ídolo”, no Brasil.
É claro que todas e todos ficamos tristes sim, afinal de contas, futebol é futebol, é parte essencial e raiz de nossa cultura. Mas, esse resultado foi, de certa maneira previsível no fim das contas, apesar da bela partida de estreia contra a Sérvia, que mostrou aos gigantes holofotes do Catar a nova dupla de matadores: Richarlison e Vinni Júnior.
Essa Copa serviu ao menos pra gente ver nascer outro novo grande ídolo nacional- Richarlison, esse sim, ídolo com “I” maiúsculo. Jovem influenciado pelas discussões avançadas sobre o sentido pleno de “civilidade” na Europa, soube tomar para si exemplos de pessoas que são referências muito melhores que o camisa 10. O atacante do Tottenham já declarou que tem como um de seus maiores ídolos o campeão de Fórmula 1 Lewis Hamilton, o menino negro da Inglaterra que tem se destacado como uma das grandes vozes de combate ao racismo no planeta.
Mas não deixemos de lado a prata da casa pelos que já foram cooptados pelo futebol europeu. Como disse Casagrande em seu cirúrgico comentário sobre a derrota na Folha de São Paulo, é preciso colocar também os que estão trabalhando dentro de casa, sem os grandes patrocínios e acostumados aos treinos no calor do Brasil. Afinal, o campeonato brasileiro dá aula de qualidade aos mais cobiçadores olheiros do mundo.
Aliás, é deste comentarista demitido da Rede Globo por seus posicionamentos políticos sensatos dentro de um deserto de coerência que é o ramo esportivo brasileiro, também a assertiva: “Se o próximo treinador for um pouco inteligente, afastará Neymar dessa nova geração para não estragá-la”. Frase esta que define a mudança que nós estamos precisando depois destes anos trevosos, em todos os campos: política, cultura, e claro , no futebol, o maior símbolo do Brasil. Mudança esta que, graças a Deus, já começou, com a eleição de Lula.
E que o bezerro de ouro comido por eles sob o convite de outro ídolo morto- Ronaldo- fique como mais uma das manchas históricas a servir de lição para as gerações futuras, muito embora eu acredite que estas já compreenderam, mais do que as velhas, que na vida não basta o talento- precisamos nos esforçar para alcançarmos a “humanidade” que o mundo precisa hoje, diga-se, sintonizar-nos com as causas urgentes do planeta.
Ídolos que viram as costas ao complexo contexto social, limitando-se à poucas atitudes assistencialistas, tornam-se mais estorvos do que propriamente líderes: estorvos a pesar nos talentos destes jovens que tinham tudo para vencer, mas, carentes de boas referências, acabaram por sucumbir à grande pressão psicológica que existe em toda copa do mundo.
Ju Abe- cantora, compositora, graduada em Filosofia e estudante de Letras/Inglês pela UFPA.